26 de março de 2012

Ela e seus devaneios




 Era só mais uma tarde como outra qualquer, uma tarde de cansaço e calor, mais um dia de rotina, ela acabara de sair de dentro de um livro, sim, de dentro de um livro, ficava tão fascinada com o universo ficcional dos livros, que a cada livro que abria, era como se fosse sugada para dentro deles, para viver aquelas historias como se fosse uma de suas personagem, sentia-se parte do enredo.
Era como se estivesse tomada por uma onda gigante de inspiração, ainda não sabia o que escrever, para quem escrever, mas precisava escrever alguma coisa, botar pra fora aquela vontade incontrolável de brincar com as palavras, assim como faziam os autores dos livros que lia.
Sabia que não conseguiria escrever grande coisa, era humilde o suficiente para não ousar se comparar a algum dos autores a quem admirava, mas por que não tentar escrever alguma coisa? Já havia escrito alguns pequenos textos antes, não eram tão ruins assim, não sabia por onde começar, decidiu então deixar que as palavras lhe fossem guiando e elas mesmas criando o texto.
Sentia-se mais confortável no mundo dos sonhos e da fantasia, o mundo real não lhe instigava, um mundo pessoas vivendo só por viver, escondendo suas emoções, era por demais sentimental, sentia a necessidade de dizer as coisas que vinham de seu coração, de certo isso não lhe era um defeito, tão pouco qualidade, era seu jeito de ser.
 O mundo real para ela era duro demais, as pessoas sempre se escondendo dentro de seu próprios mundos, ninguém confiando em ninguém, um mundo de desilusões e decepções, recusava-se a viver nesse mundo, no seu mundo irreal também existiam coisas ruins e tristes, mas o final sempre era feliz, era isso que queria, um final feliz.
Para ela, tudo que tinha que fazer era aproveitar tudo de bom que a vida tinha para lhe oferecer, não nascera com prazo de validade já determinado, então não entendia do que iria adiantar se matar de trabalhar, estudar, preocupar-se se poderia morrer a qualquer momento. Nem sempre quem leva tudo a sério demais, faz tudo certinho, chega sempre na hora, é feliz, pensava ela.
Era feliz do seu jeito, desorganizado, atrapalhado, deixando coisas pra lá de vez em quando, isso não queria dizer que era irresponsável, mas que preferia viver a só estar viva. Corria atrás dos seus objetivos sim, mas tudo no seu tempo, não iria mais se descabelar, roer unha, manicura e cabeleireiro estavam “pela hora da morte”, dizia com seu jeito quase sempre bem humorado. Acreditava que o que tivesse de ser seu uma hora seria e precisava estar viva quando isso acontecesse.
 Valorizava muito suas relações afetivas, ficava extremamente irritada com a forma com que os sentimentos eram transformados em coisas tão corriqueiras, via as pessoas amando eternamente a cada três semanas, amizades ditas eternas, mas que só duravam até o primeiro obstáculo. Coisas simples do cotidiano lhe faziam refletir, certo dia almoçando em casa sozinha como era de costume, já que seus pais trabalhavam o dia todo, achou a comida um pouco insossa, depois de colocar uma pitada de sal, foi surpreendida pela forma com que o sabor da comida havia melhorado.
Percebeu então que poderia comparar a vida aquela comida, assim como algumas comidas perdem o sabor sem uma boa pitada de sal, a vida às vezes precisa de pitadas de carinho, compreensão, atenção, pitadas de sentimentos bons, no entanto, sal demais põe a comida a perder, é preciso saber a dose certa para que não haja perdas, nem excesso, quando colocamos “sal” demais em algumas pessoas, acabamos botando-as a perder, elas esquecem o que as fez ter aquele “sabor”, e por vezes deixamos de lado outras que também precisam ser cuidadas.
Tinha medo que sua sinceridade pudesse magoar alguém, então se sentia na obrigação de guardar sua opinião pra si mesma. Também não gostava de preocupar ninguém com seus problemas, então às vezes quando lhe perguntavam como estava, mesmo tendo vontade de responder que estava péssima, tudo dando errado, não sabia o que fazer. Então apenas respondia um estou bem e você? Recebendo como resposta um também, se indagava se esse também seria um: também estou fingindo estar bem!
As pessoas perguntam se você está bem, mas você precisa entender que na maioria das vezes elas nem querem saber mesmo, é só uma forma de dizer oi!
Então nem adiantaria você enche-las de lamentações porque elas não iriam resolver seus problemas, algumas iriam fingir se preocupar, apenas por educação, no final das contas as pessoas querem que você seja forte, que esteja bem, mesmo que não esteja, repetia isso pra si mesma sempre que sentia necessidade de desabafar.
Sempre fantasiando um mundo além do qual vivia, quando criança, queria ser uma flor, para que todos a admirassem, tivessem delicadeza ao toca-la, para que desfrutassem do seu perfume e beleza, queria ter toda a atenção. Quando cresceu um pouco mais, percebeu que com o tempo as flores murcham, secam, perdem seu perfume e sua beleza. 
Foi então que resolveu que queira ser uma árvore, grande e forte, para que todos pudessem descansar em seus pés, embaixo de sua sombra, queria sentir o vento sobre meus galhos. No entanto, se deu conta de que precisava ser podada pouco a pouco, e que a maldade humana não a deixaria viver por muito tempo. 
Chegou à adolescência e decidiu que queria ser um pássaro, para poder voar livremente com as próprias asas, sentindo a brisa toca-la, sentir o vento a levando para descobrir novos horizontes. Mas, não demorou muito para cair em si e lembrar que liberdade no mundo real não é tão simples assim.
Agora ainda não sabia muito bem o queria ser, porque já aprendera que não podia ter a atenção de todos, nem fazer bem a todos, alguém sempre seria desagradado, muito menos usufruir de liberdade, pois o mundo real era um mundo onde as pessoas eram julgadas a cada passo dado, a cada atitude tomada.
Ela sabia que era uma tolice de criança acreditar nisso, mas o maior dos seus desejos era ser estrela, não uma pessoa famosa, uma estrela mesmo, dessas que enfeitam as noites, com o propósito de que mesmo longe pudesse iluminar a vida daqueles que amou aqui na terra, queria ser lembrada como um ser iluminado, motivo de admiração e alegria, que não gosta de ver o céu estrelado? De tão desastrada que era, poderia acabar sendo uma estrela cadente e voltar para o lugar de onde nunca quis sair, perto daqueles que amava.
 Mas e você? É! Você! Você acredita em que? Você também tem seus devaneios? O que você quer ser? Vai dizer que nunca teve um sonho maluco, uma decepção por não conseguir realizá-lo? Quis ter a atenção de todos e para conseguir isso acabou afastando-os sem querer? Quis voar, mas quebrou a asa e caiu de cara na realidade? Nunca quis dizer as pessoas o quando significam pra você, mas não teve coragem?
 Viveu um grande amor que logo se transformou em uma desilusão? Ficou amigo de um inimigo, ou inimigo de um amigo? Ouviu uma palavra dura de alguém que ama? Teve que acordar cedo quando queria passar o resto do dia dormindo? Levou um tombo e se machucou feio?
 Nunca teve medo? Chorou de alegria? Magoou alguém se ter a intenção? Ouviu um EU TE AMO? Também nunca disse um? Nunca amou eternamente por alguns meses, semanas, ou até mesmo dias? Ouviu um milhão de vezes aquela música que foi a sua preferida por alguns instantes?
Quem nunca pagou aquele mico e teve vontade de nunca mais sair de casa? Quem nunca sentiu pena? Gratidão? Raiva? Alegria? Ela já! E foi com tudo isso e um pouco mais que aprendeu a viver, a superar os obstáculos, encarar a realidade, ouvir palavras duras, levar tombos e esperar cicatrizar as feridas, ir à luta se queria algo, dizer às pessoas o que sentia e ouvir o que elas tinham a lhe dizer.
E o mais importante: NÃO DESISTIR! É! Não desistir daquilo que para os outros era uma bobagem, mas que para ela era importante, não aceitar ouvir um: você não vai conseguir! Porque se ela realmente queria e acreditava, ela conseguiria.
Quem define o que é bom e ruim, o que faz bem ou não, somos nós, somos responsáveis pelos caminhos que seguimos, não e fácil ninguém disse que seria, mas tudo depende da nossa força de vontade.
Quem é ela? Eu também não sei ainda, quem sabe ela se revele em um próximo surto de inspiração, ou mais um devaneio...

(LIMA, J.S.) Jaiane Lima, em 26/03/2012

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